Hoje, é celebrado o Dia da Consciência Negra, um dia que nos lembra da importância de reconhecer, refletir e agir diante da dívida histórica que o Brasil tem com sua população negra. Este não é apenas um dia de memória, mas também de compromisso.
A história da humanidade remonta a milhares de anos, e ao longo dessa extensa trajetória, as civilizações se ergueram, caíram, e evoluíram. Na Europa, por exemplo, as primeiras organizações sociais complexas começaram a se formar há mais de dois mil anos, com civilizações como a Grécia e Roma estabelecendo sistemas políticos, econômicos e sociais que ainda influenciam o mundo moderno. Já na América, as grandes civilizações indígenas, como os maias, astecas e incas, também tinham estruturas sociais bem definidas antes da chegada dos colonizadores.
No entanto, o sistema de escravidão marcou tragicamente tanto a Europa quanto as Américas. No século XVII, a escravidão se tornou uma prática central no desenvolvimento econômico de nações como Inglaterra, França e Espanha, impulsionando suas economias com o trabalho forçado de milhões de africanos. Os Estados Unidos, outro exemplo, legalizaram a escravidão desde o início da colonização, construindo boa parte de sua prosperidade sobre essa base cruel, até a abolição formal em 1865, após a Guerra Civil.
A Inglaterra, que desempenhou um papel de liderança no tráfico transatlântico de escravos, aboliu a escravidão em 1833, mas somente após séculos de enriquecimento às custas de pessoas negras. O mesmo se aplica a outras potências europeias que lucraram enormemente com o tráfico humano, perpetuando um sistema que desumanizou milhões. É preciso considerar que, enquanto civilizações na Europa já haviam estabelecido sistemas sociais complexos há muito tempo, o período de escravidão ainda se estendeu por séculos, com a exploração brutal de africanos em colônias do Novo Mundo.
Se olharmos para o Brasil, que foi o último país do Ocidente a abolir oficialmente a escravidão em 13 de maio de 1888, vemos que o legado da escravidão é mais recente aqui do que na maioria das outras nações. Pensar que o Brasil sustentou um dos maiores mercados de escravos do mundo nos lembra que o impacto dessa prática cruel ainda está enraizado na nossa sociedade.
E mesmo após a abolição, sabemos que a liberdade concedida não veio acompanhada de políticas de inclusão, reparação ou dignidade. A população negra foi deixada à própria sorte, sem acesso à terra, à educação, ou a oportunidades básicas de sustento. Se olharmos para os últimos 136 anos, isso representa um curto período, comparado aos mais de 300 anos de escravidão. Assim, a inserção plena da comunidade afrodescendente e indígena na sociedade brasileira ainda está em processo, e o racismo estrutural continua a impactar de forma cruel milhões de brasileiros.
Este dia nos recorda que, para reparar séculos de exclusão e desigualdade, precisamos de ações concretas. Precisamos reforçar a importância de políticas afirmativas, de promover a igualdade de oportunidades, e de garantir que cada brasileiro, independentemente da cor de sua pele, possa acessar plenamente os direitos que a nossa Constituição assegura.
A história nos oferece exemplos poderosos de luta e resistência. Líderes como Zumbi dos Palmares, que lutou incansavelmente pela liberdade no Quilombo dos Palmares, inspiram nossa luta pela dignidade e pela justiça. Dandara, que ao lado de Zumbi, se tornou símbolo de força e coragem. Também recordamos personalidades históricas e contemporâneas, como Abdias do Nascimento, que levantou a bandeira contra o racismo com arte, política e ativismo.
E, hoje, honramos a cultura negra que pulsa em cada aspecto da identidade brasileira: do samba ao candomblé, da literatura à culinária, da capoeira ao rap. Celebramos a resiliência e a genialidade de uma população que, apesar de todas as adversidades, continua contribuindo com suas ideias, criatividade e força para fazer do Brasil um país mais rico culturalmente.
Este é o momento de nos comprometermos a construir um Brasil verdadeiramente justo, onde todos tenham oportunidades iguais, onde a memória da resistência seja honrada com ações, onde o combate ao racismo não seja apenas discurso, mas prática diária.
O Dia da Consciência Negra é uma convocação para todos nós: para reconhecermos o nosso passado, compreendermos as injustiças ainda presentes, e lutarmos juntos por um futuro de respeito, inclusão e igualdade.
Que as palavras de Martin Luther King Jr. ressoem também aqui, quando ele disse: “A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar.” Que a nossa consciência hoje se transforme em compromisso, e que cada um de nós seja agente de mudança.
Dia da Consciência Negra! Que possamos, unidos, construir um país cada dia melhor, mais justo e digno para todos.
Luis Camargo